A questão se Calvino e a Reforma tiveram
alguma influência na arte é normalmente respondida com um "não", no sentido de
que Calvino não teria nenhum interesse, ou ainda pior, teria sido avesso à
arte. Atualmente esse ponto de vista tem se mostrado insustentável pelo
trabalho de Doumergue, Wille, van Schelven, Wencelius1 e outros. Tal
aversão a arte às vezes é encontrada em ambientes calvinistas, com certeza, mas
deriva de uma época anterior e é uma inclinação puritana possivelmente
proveniente de influências anabatistas.
Dr. Abraham Kuyper2 já discutiu
essa questão extensivamente em seu discurso reitoral, "Het Calvinisme en de
kunst"3 ("O Calvinismo e as artes"), onde ele traz a seguinte discussão:
"O Calvinismo, na medida em que também colocou seu selo em nossa vida como nação
além dos círculos Calvinistas, num sentido restrito, prestou este serviço
eterno, que ele restaurou a arte para si, abriu a arte para um mundo e para a vida cotidiana
antes desconhecida, abriu os olhos dos artistas para a beleza no aparentemente
insignificante, e fomentou um amor pela liberdade que estimulou a paixão pela
arte".
Parece um pouco estranho que
Kuyper deva argumentar, como ele faz aqui, que o Calvinismo nunca desenvolveu
um estilo artístico próprio. No entanto, eu acho que as características
essenciais desta arte foram realmente formuladas nesta declaração reitoral.
Grande liberdade e abertura para toda criação, amor pelo grande e pequeno,
consciência de certa hierarquia de vales, revogação do esplendor e do fato,
sobriedade que por um lado evita toda a idealização e por outro não tolera a
glorificação do pecado, enfatiza no humano sem o tornar herói, enquanto, no
entanto, reconhece a importância da luta interna e externa e tem um interesse
nos aspectos mais íntimos das relações humanas – tudo isso é sempre fruto, para
arte, de uma abordagem de vida nutrida pela Escritura.
Além dos pintores alemães
do século XVII, pode-se também referir a Albrecht Dürer4, os últimos
trabalhos de A. Atdorfer, H. Schutz, Johann Sebastian Bach, J. Cats, etc5. Além
disso, uma revisão dos escritores preocupados com o lugar da arte na cosmovisão
Calvinista ou Reformada, mostra que eles sempre evitaram qualquer forma de
estetismo6 enquanto concediam arte a um lugar definido, mas modesto;
aqui nós também encontramos respeito pela consistência e beleza, mas anulação
de toda ostentação.
Esta é a introdução, ou primeira
página, do livro “Calvinism and art, an
annotated bibliography (Calvinismo e arte, uma bibliografia anotada)”, publicado
em: M. Hengelaar-Rookmaaker (ed.): H.R. Rookmaaker: The Complete Works 4, Piquant – Carlisle, 2003.
Notas:
1 Não há referências a
estes, mas acredita-se ser artistas ou críticos de arte.
2 Pastor reformado que
também foi ministro da Holanda, escreveu vários livros acerca do calvinismo
relacionado a outras coisas.
4 Teórico de arte
Alemão, também pintor, ilustrador, gravador e matemático.
5 Artistas alemães da
referida época.
6 Escola literária e artística de origem
anglo-saxônica, que se propõe reconduzir as artes às suas formas primitivas.
Texto traduzido pelo jovem diácono Marcus Lopes, membro da Igreja Presbiteriana de Cuiabá, estudante de Psicologia na UFMT e, minha ovelha. Os grifos são meus.
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