O Didaquê, também conhecido como "Instrução dos Doze Apóstolos", é um dos escritos cristãos mais antigos que se tem notícia. Estima-se - com alto grau de confiabilidade - que tenha sido composto no século I, e a única divergência significativa quanto à sua datação é se teria sido elaborado antes ou depois da destruição de Jerusalém no ano 70 d. C. Eusébio de Cesareia, no seu clássico "História Eclesiástica" (que você pode baixar o ebook aqui), do início do séc. IV, já lhe dava enorme importância.
Ainda que não se atribua a sua autoria diretamente aos primeiros apóstolos, se imagina que era uma espécie de compilação das orientações gerais que eles deixaram de viva voz ou aos seus primeiros discípulos sobre a organização da igreja, da vida e do trabalho cristão no primeiro século. A sua importância e a sua utilização para a Igreja primitiva era tamanha que chegou a ser cogitado para ser incluído no cânon do Novo Testamento, que somente foi estabelecido no séc. IV.
Com a sua não inclusão no cânon, foi paulatinamente sendo esquecido até ser considerado perdido por vários séculos, e a descoberta de um manuscrito completo num mosteiro de Constantinopla, em 1873, o trouxe de volta à luz da Igreja como um importante documento histórico do seu começo.
O Didaquê (que pode ser lido na íntegra aqui) continua sendo, infelizmente, um documento cristão pouco conhecido, e é muito interessante cotejar as práticas prescritas pelos primeiros (e verdadeiros) apóstolos com aquelas que não só os "apóstolos modernos", mas também muitos pastores, dizendo-se portadores de uma "nova revelação", insistem em apresentar como "cristãs". Basta ler os capítulos XI e XII do Didaquê (destacamos alguns versículos) e você poderá tirar suas próprias conclusões:
CAPÍTULO XI
CAPÍTULO XI
1. Se vier alguém até você e ensinar tudo o que foi dito anteriormente, deve ser acolhido.
2. Mas se aquele que ensina é perverso e ensinar outra doutrina para te destruir, não lhe dê atenção. No entanto, se ele ensina para estabelecer a justiça e conhecimento do Senhor, você deve acolhê-lo como se fosse o Senhor.
3. Já quanto aos apóstolos e profetas, faça conforme o princípio do Evangelho.
4. Todo apóstolo que vem até você deve ser recebido como o próprio Senhor.
5. Ele não deve ficar mais que um dia ou, se necessário, mais outro. Se ficar três dias é um falso profeta.
6. Ao partir, o apóstolo não deve levar nada a não ser o pão necessário para chegar ao lugar onde deve parar. Se pedir dinheiro é um falso profeta.
7. Não ponha à prova nem julgue um profeta que fala tudo sob inspiração, pois todo pecado será perdoado, mas esse não será perdoado.
8. Nem todo aquele que fala inspirado é profeta, a não ser que viva como o Senhor. É desse modo que você reconhece o falso e o verdadeiro profeta.
9. Todo profeta que, sob inspiração, manda preparar a mesa não deve comer dela. Caso contrário, é um falso profeta.
10. Todo profeta que ensina a verdade mas não pratica o que ensina é um falso profeta.
11. Todo profeta comprovado e verdadeiro, que age pelo mistério terreno da Igreja, mas que não ensina a fazer como ele faz não deverá ser julgado por você; ele será julgado por Deus. Assim fizeram também os antigos profetas.
12. Se alguém disser sob inspiração: "Dê-me dinheiro" ou qualquer outra coisa, não o escutem. Porém, se ele pedir para dar a outros necessitados, então ninguém o julgue.
CAPÍTULO XII
CAPÍTULO XII
1. Acolha toda aquele que vier em nome do Senhor. Depois, examine para conhecê-lo, pois você tem discernimento para distinguir a esquerda da direita.
2. Se o hóspede estiver de passagem, dê-lhe ajuda no que puder. Entretanto, ele não deve permanecer com você mais que dois ou três dias, se necessário.
3. Se quiser se estabelecer e tiver uma profissão, então que trabalhe para se sustentar.
4. Porém, se ele não tiver profissão, proceda de acordo com a prudência, para que um cristão não viva ociosamente em seu meio.
5. Se ele não aceitar isso, trata-se de um comerciante de Cristo. Tenha cuidado com essa gente!
Com informações do excelente O Contorno das Sombras.
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